segunda-feira, 26 de fevereiro de 2018

39 - Militão de Sardes (†177) Homilias


39
Estudo sobre os Pais da Igreja: Vida e Obra
Militão de Sardes (†177)
Homilias

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1. Homilia de Páscoa: «Magoado com a dureza dos seus corações»

É Ele o cordeiro sem voz, é Ele o cordeiro imolado, Ele que nasceu de Maria, a cordeira cheia de graça. Ele é o que foi retirado do rebanho para ser conduzido ao matadouro...
Ele foi conduzido à morte. Onde? No coração de Jerusalém. Porquê ? Porque tinha cuidado dos seus coxos, purificado os seus leprosos, devolvido a luz aos seus cegos e ressuscitado os seus mortos (Lc 7,22). Eis a razão por que sofreu. Está escrito na Lei e nos profetas: “Pagaram-me o mal pelo bem. A minha alma vive o abandono; meditaram o mal contra mim. Prendamos o justo, diziam ele, porque nos é odioso” (Sl 37,21 ; Jr 11,19).
Porque cometeste este crime sem nome? Desonraste aquele que te tinha honrado, humilhaste o que te tinha exaltado, renegaste aquele que te tinha reconhecido, rejeitaste o que te tinha chamado, mataste aquele que te dava a vida... Era preciso que ele sofresse, mas não por ti. Era preciso que fosse julgado, mas não por ti. Era preciso que fosse crucificado, mas não pelas tuas mãos. Porque não rezaste a Deus esta oração: “Ó Senhor, se é preciso que o teu filho sofra, se é essa a tua vontade, que ele sofra, mas não por mim”.

2. Homilia de Páscoa: «O mistério da Páscoa: a novidade do Verbo encarnado»

Sobre a Páscoa
Foi lida a Escritura a respeito do êxodo hebreu, foram explicadas as palavras do mistério: como a ovelha foi imolada e o povo foi salvo.
Compreendei, pois, caríssimos! É assim
novo e antigo,
eterno e temporal,
corruptível e incorruptível,
mortal e imortal
o mistério da Páscoa:
antigo segundo a Lei,
novo segundo o Verbo;
temporal na figura,
eterno na graça;
corruptível pela imolação da ovelha,
incorruptível pela vida do Senhor;
mortal pela sepultura, na terra,
imortal pela ressurreição dentre os mortos.
Antiga a Lei, novo o Verbo;
temporal a figura, eterna a dádiva;
corruptível a ovelha, incorruptível o Senhor,
o qual, imolado como cordeiro, ressurgiu como Deus.
Pois, como a ovelha, foi levado ao matadouro,
mas não era ovelha;
como o cordeiro, não abriu a boca,
mas não era cordeiro.
Passou a figura, persiste a realidade.
Em vez do cordeiro, Deus presente,
em vez da ovelha, um homem,
e neste homem, Cristo,
aquele que sustém todas as coisas.
Assim, o sacrifício da ovelha,
e a solenidade da Páscoa,
e a letra da Lei,
cederam lugar ao Cristo Jesus,
por causa do qual tudo sucedera na antiga Lei,
e muito mais sucede na nova disposição.
Pois a Lei se converteu em Verbo,
o antigo em novo,
ambos saídos de Sião, e de Jerusalém.
O mandamento se converteu em dádiva,
a figura em realidade,
o cordeiro em Filho,
a ovelha em homem,
o homem em Deus.
Com efeito, aquele que nascera como Filho,
e fora conduzido como cordeiro,
sacrificado como ovelha,
sepultado como homem,
ressuscitou dentre os mortos como Deus,
sendo por natureza Deus e homem.
Ele é tudo:
enquanto julga, é lei;
enquanto ensina, Verbo;
enquanto gera, pai;
enquanto sepultado, homem;
enquanto ressurge, Deus;
enquanto gerado, Filho;
enquanto padece, ovelha;
ele, Jesus Cristo,
a quem seja dada a glória pelos séculos. Amém.
Tal é o mistério da Páscoa,
como foi descrito na Lei
e como o acabamos de ler.

3. Homilia: As figuras do Antigo Testamento,
suplantadas pela realidade do Novo.

A salvação do Senhor e a realidade
foram prefiguradas no povo ( judeu),
as prescrições do Evangelho prenunciadas pela Lei.
O povo era como o esboço de um plano,
a Lei como a letra de uma parábola;
mas o Evangelho é a explicação da Lei e seu cumprimento,
e a Igreja o lugar onde isso se realiza.
O que existia como figura era valioso
antes que ocorresse a realidade,
maravilhosa a parábola antes que viesse a explicação.
O povo tinha seu valor antes que se estabelecesse a Igreja,
Lei era admirável antes que refulgisse o Evangelho.
Mas quando surgiu a Igreja e se apresentou o Evangelho,
esvaziou-se a figura, sua força passou para a realidade,
a Lei se cumpriu, transfundiu-se no Evangelho...
O povo perdeu razão de ser quando veio a Igreja,
a imagem se fez abolida quando apareceu o Senhor.
O que antes era valioso perdeu seu valor,
frente à manifestação do que era realmente valioso por natureza.
Valioso era antes o sacrifício da ovelha,
agora perdeu o valor, por causa da vida do Senhor.
Valiosa era a morte da ovelha,
agora perdeu o valor, por causa da salvação do Senhor.
Valioso era o sangue da ovelha,
mas perdeu o valor, por causa do Espírito do Senhor.
Valioso era o cordeiro que não abria a boca,
mas perdeu o valor, por causa do Filho sem mácula.
Valioso era o templo terreno,
mas perdeu o valor, por causa do Cristo celeste.
Valiosa era a Jerusalém de baixo,
mas perdeu o valor, por causa da Jerusalém do alto.
Valiosa era a pequena herança,
mas perdeu o valor por causa da amplitude do dom.
Porque não foi em parte alguma da terra,
em nenhuma faixa estreita da terra
que se estabeleceu a glória de Deus,
e sim por todos os confins se derramou seu dom,
em toda parte armou sua tenda o Deus onipotente.
Por Jesus Cristo,
a quem seja dada glória pelos séculos. Amém.


4. Homilia: O Pecado do Homem
Deus, no princípio,
tendo criado pelo Verbo o céu,
a terra e tudo o que neles se encerra,
modelou do barro o homem
e comunicou-lhe seu sopro.
Colocou-o em seguida num jardim
voltado para o Oriente, o Eden,
para que ali vivesse feliz.
E deu-lhe um mandamento...
Mas o homem,
sendo por natureza capaz do bem e do mal,
como uma porção de terra
capaz de receber sementes boas e más,
escutou ao conselheiro hostil
e, tomando o fruto da árvore,
transgrediu o mandamento,
desobedeceu a Deus.
Por conseguinte,
foi deixado neste mundo,
como numa prisão de condenados.
Após muitos anos
e após gerar numerosa prole,
voltou à terra,
de cuja árvore colhera o fruto,
legando a seus filhos esta herança...
não a pureza, mas a luxúria,
não a imortalidade, mas a corrupção,
não a honra, mas a desonra,
não a liberdade, mas a escravidão,
não a realeza, mas a tirania,
não a vida, mas a morte,
não a salvação, mas a perdição.
Nova e terrível tornou-se a ruína dos homens sobre a terra.
Eis o que lhes aconteceu:
foram tiranizados pelo pecado,
e levados a lugares de concupiscência,
para viverem assaltados por prazeres insaciáveis,
pelo adultério, a fornicação, a impureza,
os maus desejos, a cobiça,
os homicídios, o derramamento de sangue,
a tirania da maldade e da injustiça.
Era o pai lançando a espada contra o filho,
o filho erguendo a mão contra o pai,
o ímpio golpeando a lactante,
o irmão ferindo o seu irmão,
o hospedeiro injuriando o hóspede,
o amigo assassinando seu amigo,
o homem degolando o semelhante.
Todos se transformaram na terra em homicidas,
fratricidas, parricidas, infanticidas...
E com isso exultava o Pecado:
colaborador da Morte,
precedia-a nas almas dos homens
e preparava-lhe como alimento os corpos mortos.
Imprimia em toda alma sua marca,
para fazer morrer os que a traziam.
Toda carne, pois, caiu sob o pecado,
e todo corpo sob a morte.
Toda alma foi arrancada de sua morada de carne
e o que foi tirado da terra se dissolveu na terra,
o que foi dado por Deus se encarcerou no Hades.
Estava destruída a bela harmonia,
desfeito o belo corpo.
O homem dividido sob o poder da morte,
estranha desgraça a aprisioná-la:
Era arrastado como cativo pelas sombras da morte,
jazia abandonada a imagem do Pai.
Eis a razão por que se cumpriu o mistério da Páscoa
no corpo do Senhor.


5. Homilia: O Desígnio Salvador em Cristo
O Senhor havia ordenado de antemão seus próprios padecimentos nos patriarcas, nos profetas e em todo o povo, pondo como seu selo a Lei e os profetas. Pois o que devia realizar-se de modo inaudito e grandioso estava preparado desde muito, a fim de que ao suceder fosse crido, depois de tão vaticinado (...)
Antigo e novo o mistério do Senhor:
antigo na figura, novo no dom.
Se vês a figura,
verás a realidade ao longo de sua atuação.
Se queres contemplar o mistério do Senhor
verás Abel, assassinado como ele,
Isaac, aprisionado como ele,
José, vendido como ele,
Moisés, exposto como ele,
Davi, perseguido como ele,
os profetas padecendo como ele e por causa dele.
Contempla também o cordeiro degolado na terra egípcia,
que abateu o Egito e salvou a Israel por seu sangue (...)
Aquele que veio dos céus à terra por causa do homem que sofria,
e se revestiu do homem nas entranhas de uma Virgem,
aparecendo como homem.
Aquele que assumiu os sofrimentos de quem sofria,
tomando um corpo capaz de sofrer,
aquele que anulou os sofrimentos da carne,
destruindo com seu espírito imortal a morte homicida (...)
Aquele que nos tirou da escravidão para a liberdade,
das trevas para a luz,
da morte para a vida,
da tirania para o reino eterno.
Que fez de nós um sacerdócio novo
e um povo escolhido para sempre,
Ele, a Páscoa de nossa salvação...
Ele, que se encarnou numa Virgem,
se deixou suspender na cruz,
foi sepultado na terra,
ressuscitou dos mortos,
foi arrebatado aos céus.
Ele, o cordeiro emudecido,
o cordeiro imolado,
nascido de Maria, a ovelha bela,
o cordeiro levado do rebanho ao matadouro,
sacrificado à tarde, sepultado à noite.
Não lhe quebraram os ossos no madeiro,
na terra não sofreu a corrupção,
mas ressurgiu dentre os mortos,
ressuscitou o homem das profundezas do sepulcro.
Ele, entregue à morte.
Onde?
No meio de Jerusalém.
Por que?
Porque curou os coxos,
purificou os leprosos,
trouxe a luz aos cegos,
despertou os mortos.
Por isto padeceu...
Por que cometeste, ó Israel, tão grande injustiça,
entregando teu Senhor a tais sofrimentos,
ele, teu amo,
ele, que te plasmou,
te criou,
te honrou,
te chamou Israel?
Não te mostraste" Israel" pois não viste a Deus,
não reconheceste o Senhor,
não soubeste ser ele o primogênito de Deus,
aquele que foi gerado antes da estrela matutina,
aquele que fez brotar a luz,
fez brilhar o dia,
separou as trevas,
firmou o primeiro fundamento,
suspendeu a terra,
secou o abismo,
estendeu o céu,
organizou o mundo,
dispôs no alto os astros,
fez resplandecer as estrelas,
fez os anjos celestiais,
fixou nas alturas os tronos,
modelou na terra o homem!
Ele, o que te escolheu e te guiou de Adão a Noé,
de Noé a Abraão,
de Abraão a Isaac, a Jacó e aos patriarcas;
aquele que te conduziu ao Egito e te protegeu e sustentou,
que iluminou teu caminho com a coluna de fogo,
te ocultou sob a nuvem,
e dividiu o mar Vermelho para atravessares suas águas.
Que dispersou teu inimigo,
te deu o maná do alto,
e a água da pedra.
Que te deu a Lei em Horeb,
e te fez herdar a terra,
que te enviou os profetas.
Verdadeiramente é amarga
conforme está escrito:
"Comereis pães ázimos com ervas amargas".
Amargos para ti os cravos que afiaste,
amarga a língua que aguçaste,
amargas as falsas testemunhas que propuseste,
amargas as cordas que preparaste.
amargos os açoites que descarregaste,
amargo para ti foi Judas, a quem pagaste,
amargo Herodes a quem obedeceste,
amargo Caifás, em quem confiaste,
amargo o fel que ofereceste,
o vinagre que cultivaste,
amargos os espinhos que ajuntaste,
amargas as mãos que ensanguentaste.
Entregaste teu Senhor à morte, no meio de Jerusalém...
O triunfo de Cristo
Ele, o Senhor, revestido do homem,
padecente pelo homem que sofria,
atado pelo homem prisioneiro,
julgado em prol do culpado,
sepultado pelo que jazia na terra,
ressurgiu dentre os mortos e clamou em alta voz:
"Quem se levantará em juízo contra mim?
Venha defrontar-se comigo!
Eu libertei o condenado,
vivifiquei o morto,
reergui o sepultado.
Quem me irá contradizer?
Eu, o Cristo, destruí a morte,
triunfei do inimigo,
esmaguei o inferno,
rnanietei o forte,
arrebatei o homem para as alturas dos céus.
Eu, o Cristo!
Vinde, pois, famílias dos homens manchadas por pecados,
recebei o perdão dos pecados!
Pois sou vosso perdão,
eu, a Páscoa da salvação,
O cordeiro imolado por vós,
a vossa redenção,
a vossa vida,
a vossa ressurreição,
a vossa luz,
a vossa salvação,
o vosso rei.
Eu vos elevarei à sublimidade dos céus,
e vos mostrarei o Pai que existe desde os séculos,
vos ressuscitarei por minha destra".
A Ele, o Cristo,
o Alfa e o Omega,
o Começo e o Fim,
o Inenarrável Começo,
o Incompreensível Fim,
o Rei,
a Ele, Jesus,
o Chefe,
o Senhor,
O que ressurgiu dentre os mortos,
O que está assentado à direita do Pai,
O que conduz ao Pai e é conduzido pelo Pai,
a Ele, glória e poder pelos séculos. Amém.

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terça-feira, 20 de fevereiro de 2018

38 - Estudo sobre os Pais da Igreja: Vida e Obra Militão de Sardes (†177) Introdução

38
Estudo sobre os Pais da Igreja: Vida e Obra
Militão de Sardes (†177)
Introdução

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No fim do segundo século, conforme mostra a obra História Eclesiástica, de Eusébio de CesaréiaPolícrates de Éfeso enviou a Roma uma carta na qual defendia a observância da “Páscoa no décimo quarto dia, segundo o evangelho, sem nenhuma transgressão, mas conformando-se à regra da fé”.
De acordo com essa carta, Melito — bispo de Sardes, em Lídia — era um dos que defendia o dia 14 de nisã como a data a ser observada.
A carta afirmava que os contemporâneos de Melito o consideravam um dos ‘grandes luminares que adormeceram na morte’. Polícrates disse que Melito não se casou e “viveu inteiramente sob o Espírito Santo e repousa em Sardes, esperando a visita do Senhor que virá dos céus, quando ressuscitará dos mortos”.
Melito foi um homem corajoso e determinado. De fato, ele escreveu uma Apologia dos cristãos — uma das primeiras de que há registro — dirigida a Marco Aurélio, imperador romano de 161 EC a 180 EC.
Ele não tinha medo de defender o cristianismo e de denunciar homens perversos e gananciosos. Esses homens procuravam obter várias ordens imperiais como desculpa para perseguir e condenar injustamente os cristãos, a fim de roubarem seus bens.
Melito corajosamente escreveu o seguinte ao imperador: “Nós te apresentamos apenas o pedido de tomares conhecimento primeiramente de quais são os invejosos e sentencieis de acordo com o direito se eles são merecedores de morte e suplício ou de salvação e tranquilidade. Se, porém, de ti não se originam essa decisão e esse novo edito, que nem mesmo conviriam contra bárbaros inimigos, postulamos com a maior insistência que não nos deixes entregues a essa pública rapina.”

Melito demonstrava muito interesse no estudo das Escrituras Sagradas. Embora não tenhamos uma lista completa de suas obras, os títulos de algumas delas revelam o interesse que ele tinha em assuntos bíblicos. Estes são alguns dos títulos: Da Maneira de Viver e das Profecias; A Fé do Homem; A Criação; O Batismo; A Verdade, a Fé e o Nascimento de Cristo; A Hospitalidade e a Chave; O Diabo Apocalipse de João.
Fez questão de viajar para terras bíblicas a fim de pesquisar o número exato de livros das Escrituras Hebraicas. A respeito disso ele escreveu: “Tendo ido, portanto, ao Oriente e tendo estado até mesmo no lugar onde a Escritura foi anunciada e cumprida, tive exato conhecimento acerca dos livros do antigo Testamento. Levantei uma lista, que te envio.”
Essa lista não menciona os livros de Neemias e de Ester, porém, é o mais antigo catálogo dos livros canônicos das Escrituras Hebraicas em obras de professos cristãos.
Durante sua pesquisa, Melito compilou uma série de versículos, tirados das Escrituras Hebraicas, que contêm profecias acerca de Jesus.
A obra de Melito intitulada Éclogas mostra que Jesus era o muito esperado Messias e que a Lei mosaica e os Profetas apontavam para Cristo.

Era notória a forte presença judaica em cidades importantes da Ásia Menor. Os judeus de Sardes, onde Melito vivia, observavam a Páscoa hebraica em 14 de nisã. Melito escreveu um sermão, com o título A Páscoa, que mostrava a legitimidade da Páscoa segundo a Lei mosaica e defendia a observância cristã da Refeição Noturna do Senhor em 14 de nisã.
Depois de fazer comentários sobre o capítulo 12 de Êxodo e de mostrar que a Páscoa prefigurava o sacrifício de Cristo, Melito explicou que, uma vez que Deus já havia abolido a Lei mosaica, não fazia sentido os cristãos observarem a Páscoa.
Depois ele mostrou por que o sacrifício de Cristo era necessário: Deus colocou Adão num paraíso onde ele poderia viver feliz. Mas o primeiro homem desobedeceu à ordem de não comer da árvore do conhecimento do que é bom e do que é mau. Por isso, surgiu a necessidade de um resgate.
Melito reafirmou que Jesus havia sido enviado à Terra e morrido numa cruz para resgatar do pecado e da morte quem acreditasse nele. É interessante que Melito tenha usado a palavra grega xylon, que significa “madeiro”, ao escrever sobre a cruz em que Jesus morreu.
Melito não era conhecido apenas na Ásia Menor. Tertuliano, Clemente de Alexandria e Orígenes conheciam suas obras.
No entanto, o historiador Raniero Cantalamessa declara: “O declínio de Melito, que levou ao desaparecimento gradual das suas obras, começou quando os quartodecimanos (que guardavam o dia 14 de Nisa para comemorar a Páscoa) passaram a ser considerados hereges — depois que o costume de celebrar a Páscoa Dominical ficou estabelecido.”
Por fim, as obras de Melito desapareceram quase por completo.
Melito nos proveu com o que é possivelmente o mais antigo cânon cristão do Antigo Testamento conhecido, tendo viajado por toda a Palestina (e provavelmente à famosa biblioteca de Cesareia Marítima) tentando obter informações sobre este assunto.
O cânon de Melitão era este:
De Moisés, cinco livros: Gênesis, Êxodo, Números, Levítico e Deuteronômio; Josué (filho de Nun), Juízes, Rute; de Reis, quatro livros; de Crônicas, dois; de Salmos de Davi, de Provérbios de Salomão (Sabedoria) também, Eclesiastes, Cântico dos Cânticos, Jó; de profetas: Isaías, Jeremias; dos doze profetas menores, um livro; Daniel, Ezequiel e Esdras.

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sábado, 10 de fevereiro de 2018

37 Estudo sobre os Pais da Igreja: Vida e Obra Hipólito de Roma (160 - 235) Obra: Tradição Apostólica Partes 3 e 4

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37
Estudo sobre os Pais da Igreja: Vida e Obra
Hipólito de Roma (160 - 235)
Obra: Tradição Apostólica
Partes 3 e 4

I. A Comunhão dominical
No domingo pela manhã, o bispo distribuirá a comunhão, se puder, a todo o povo com as próprias mãos, cabendo aos diáconos partir do pão. Os presbíteros também poderão parti-lo. Quando o diácono apresentar a eucaristia ao presbítero, estenderá o vaso e o próprio presbítero o tomará e distribuirá ao povo pessoalmente. Nos outros dias, os fiéis receberão a eucaristia de acordo com as ordens do bispo.

II. O jejum
As viúvas e as virgens devem jejuar e orar freqüentemente pela Igreja. Os presbíteros e os leigos podem jejuar quando quiserem. O bispo, porém, não pode jejuar a não ser no dia em que todo o povo o faz, pois é possível que alguém queira levar algo até a igreja, não podendo ele recusar. Pois, se partir o pão, deverá prová-lo.

III. O Ágape
Caso o presbítero não esteja presente, o diácono dará, em casos de urgência, o sinal [signum] aos enfermos com cuidado. Após dar o necessário e receber o que for distribuído, dará graças e aí comerão. Todos aqueles que recebem algo devem dar com cuidado: se alguém receber algo para levar a uma viúva, um doente ou alguém que se dedique à Igreja, devem levá-lo no mesmo dia. Se não o fizer, deve levar no dia seguinte, acrescentando com algo de seu por ter permanecido na sua casa o pão dos pobres.

IV. A lucerna
No início da noite, com a presença do bispo, o diácono trará a lucerna e aquele, de pé no meio de todos os fiéis presentes, dará graças. Primeiramente, fará a saudação, dizendo: ─ O Senhor esteja convosco! O povo responderá: ─ E com o teu espírito! [Dirá:] ─ Demos graças ao Senhor! E responderão: ─ É digno e justo. A Ele convém a grandeza e a exaltação com a glória. Não dirá: "Corações ao alto", porque já o faz no Sacrifício, mas orará da seguinte forma: ─ Graças te damos, Senhor, pelo teu Filho Jesus Cristo Nosso Senhor, pelo qual nos iluminaste, revelando-nos a luz incorruptível. Atingindo agora o fim do dia e chegando a noite, tendo-nos saturado a luz do dia que criaste para nos saciar, e não carecendo agora da luz da tarde pela tua graça, louvamos-te e glorificamos-te, pelo teu Filho Jesus Cristo Nosso Senhor, por quem a ti a glória, o poder e a honra, com o Espírito Santo, agora e sempre e pelos séculos dos séculos. Amém. Responderão todos: ─ Amém. Terminada a Ceia, de pé, todos orarão e os meninos e as virgens entoarão salmos. A seguir, o diácono, ao receber o cálice preparado do sacrifício, entoará um desses salmos que possui a palavra "Aleluia". Se o presbítero ordenar, entoará outro salmo do mesmo tipo. Depois que o bispo oferecer o cálice, dirá um dos que a este se referem, tudo com "Aleluia", e todos repetirão. Recitando-os, repetirão sempre "Aleluia", que significa "louvamos Aquele que é Deus", ou também “Glória e louvor Àquele que criou o Universo somente pelo Verbo”. Concluído o salmo, o bispo abençoará o cálice e distribuirá os pedaços de pão aos fiéis.

V. A Ceia
Os fiéis presentes, durante a Ceia, antes de cortarem o seu próprio pão, receberão das mãos do bispo o pedaço de pão que é uma eulogia, e não a Eucaristia, Corpo do Senhor. É preciso que todos tomem o cálice e rendam graças sobre ele antes de beberem. Portanto, com pureza, comam e bebam. Aos catecúmenos será dado o pão de exorcismo e oferecido um cálice. O catecúmeno não participará da Ceia do Senhor. Durante todo o Sacrifício, aquele que se serve deve ser digno de quem o convidou, pois para isso foi chamado a entrar sob o seu teto. Agora, quando comerdes e beberdes, fazei-o com dignidade e não com irresponsabilidade, para que ninguém fique zombando ou para que aquele que te convidou não se entristeça com a vossa afronta, esperando ser digno que os santos entrassem em sua casa porque, diz “vós sois o sal da terra”. Se alguém oferecer a todos aquilo que se chama em grego “apoforeton”, aceitai a vossa parte. Porém, se fordes convidado a comer, fazei-o de forma a sobrar, para que todos comam o suficiente e para que aquele que vos convidou possa mandar algo a quem quiser, como sobras dos santos, e fique feliz com a vossa atenção. Comendo, sirvam-se em silêncio os convidados, sem discussões, falando somente o que for permitido pelo bispo, respondendo-lhe se perguntar algo. Ao falar o bispo, calem-se todos, com discrição e respeito, até que ele volte a fazer perguntas. Se os fiéis comparecerem à Ceia sem o bispo, com a presença de um presbítero ou um diácono, deverão comer com a mesma dignidade e apressar-se a receber o pão bento da mão do presbítero ou diácono. Também o catecúmeno receba o pão do exorcismo. Reunindo-se leigos, procedam com prudência, pois um leigo não pode conferir o pão bento. Comam todos em nome do Senhor, pois agrada a Deus quando todos, iguais e sóbrios, somos ciosos do nosso comportamento, mesmo entre os gentios. As viúvas convidadas para a ceia devem ser de idade madura e devem ser dispensadas antes do final da tarde. Quem não puder convidá-las por causa do cargo que exercem, deve dispensá-las após dar-lhes alimento e vinho que tomarão em casa da forma que lhes agradar.

VI. Frutos oferecidos ao Bispo
Todos devem se apressar a trazer os primeiros frutos da estação ao bispo. Este irá oferecê-los e abençoá-los e, citando quem os oferece, dirá: ─ Graças te damos, ó Deus, e te oferecemos as primícias dos frutos que nos deste para que os tomemos, nutrindo-os pelo teu Verbo, ordenando à terra que os produza com alegria o alimento dos homens e de todos os animais. Por causa disso tudo, te louvamos, ó Deus, e também por tudo que nos proporcionaste, provendo para nós toda a criação dos mais diversos frutos. Por teu Filho, Jesus Cristo Nosso Senhor, por quem a ti a glória pelos séculos dos séculos. Amém.

VII. Bênção dos frutos
Os frutos que podem ser abençoados são a uva, o figo, a romã, a azeitona, a pêra, a maçã, a amora, o pêssego, a cereja, a amêndoa e os damascos. Não podem [ser abençoados] a melancia, o melão, os pepinos, a cebola, o alho ou qualquer outro legume. Pode-se oferecer, às vezes, flores: rosas e lírios, mas não outras. E, sobre todas as coisas, os que as recebem deem graças ao santíssimo Deus, para a sua Glória.

VIII. O jejum de Páscoa
Na Páscoa, ninguém coma antes de se fazer o Sacrifício, pois quem assim proceder não terá seu jejum considerado. Se uma mulher estiver grávida ou não se sentir bem, não podendo jejuar durante os dois dias, jejue pelo menos no sábado, já que é necessário; mas será um jejum de pão e água. Se alguém, por algum problema, se esquecer da Páscoa, jejue após a Quinquagésima. A imagem passou, cessando no segundo mês, mas todo aquele que tiver aprendido a Verdade deverá jejuar.

IX. Os diáconos trabalham com o Bispo
Que cada diácono, com seus subdiáconos, executem suas tarefas junto ao bispo. Também lhes serão recomendados os doentes, para que os visitem, caso seja de agrado do bispo, pois o doente sempre se alegra quando o chefe dos sacerdotes dele se lembra.

X. A oração
Os fiéis de Deus devem orar assim que acordarem e levantarem, antes de tocar qualquer coisa. Somente depois disso é que devem sair para o trabalho. Contudo, se houver instrução pela Palavra, que prefiram ouvir a Palavra de Deus, pois esta é o consolo da alma, e se apressem a ir à Igreja, onde o Espírito floresce.

XI. Comunhão diária
Que todo fiel corra a receber a Eucaristia antes de experimentar qualquer outra coisa. Se receber por causa de sua fé, não se prejudicará, mesmo sendo o homem mortal. Todos devem se esforçar para não permitir que o infiel prove a Eucaristia, nem um rato ou outro animal. Deve-se cuidar para que dela não caia uma migalha e se perca, pois ela é o Corpo de Cristo que deve ser comido pelos fiéis e não pode ser negligenciado. Consagrado o cálice em nome de Deus, que recebestes como a imagem do Sangue de Cristo, não queirais derramá-lo. Que o espírito hostil não venha lambê-lo, desprezando-o, pois serias culpado para com o Sangue, como quem despreza o valor pelo qual foi comprado.

XII. Reunião do Clero
Os diáconos e os presbíteros deverão se reunir diariamente no local determinado pelo bispo. Não se deixem de reunir a menos que a doença impeça. Reunindo-se todos, ensinem os que estão na igreja e, após a oração, dirija-se cada um ao seu trabalho.

XIII. Os cemitérios
Que ninguém encontre dificuldades para sepultar o irmão nos cemitérios, já que estes pertencem aos pobres. Porém, pague-se o salário ao coveiro, bem como o preço dos tijolos. O bispo deve sustentar guardas e zeladores para que nenhuma taxa seja cobrada àqueles que procuram os cemitérios.

XIV. A oração (II)
Todo fiel, homem ou mulher, ao acordarem, lavem as mãos e rezem a Deus antes de tocar qualquer coisa. Só após isto, dirijam-se ao trabalho. Havendo instrução da Palavra de Deus, prefiram encaminhar-se ao local recordando que, na verdade, estão ouvindo a Deus na pessoa daquele que prega. Todo aquele que orar na Igreja vencerá a maldade do dia; aquele que teme a Deus considerará um grande mal não ter ido à instrução, principalmente se souber ler ou sabendo que o catequista estava presente. Que nenhum de vós se atrase para ir à igreja, lugar onde se ensina! Ao que fala, será concedido dizer o que é útil a cada um. Ouvirás coisas nas quais não imaginas e tirarás proveito do que o Espírito Santo vos disser pelo catequista. Vossa fé será reforçada com aquilo que ouvirdes. Aí também será dito o que deveis fazer em casa. Por isso, cada um deve se preocupar em ir à Igreja, onde o Espírito Santo floresce. Nos dias em que não houver instrução, cada um em sua casa tome o Santo Livro e leia o que lhe parecer proveitoso. Se estiverdes em casa, orai e bendizei a Deus na hora terceira ( 9 horas). Se estiverdes num outro local, orai a Deus no coração, pois foi nessa hora que Cristo se viu pregado no madeiro. Também por essa razão, a Lei do Antigo Testamento prescreve que se ofereça o pão da proposição, como imagem do Corpo e Sangue de Cristo, e a imolação do Cordeiro, como imagem do Cordeiro perfeito: Cristo é o Pastor e o Pão que desceu do céu. Orai, igualmente, na hora sexta (12 horas) pois, quando Cristo foi pregado na cruz, o dia se dividiu e as trevas surgiram. Nessa hora, todos orarão uma oração fervorosa, imitando a voz Daquele que, ao orar, cobriu de trevas toda a Criação perante os judeus incrédulos. Façam, ainda, uma grande prece exaltando o Senhor por volta da hora nona (15 horas), para sentirem como a alma dos justos glorifica a Deus, que não é mentiroso e lembra dos seus santos, enviando seu Verbo para iluminá-los. Foi nessa hora que Cristo, ferido no lado, verteu água e sangue, e iluminou o resto do dia até o final da tarde. Começando a dormir, Cristo originou o dia seguinte e concluiu a imagem da ressurreição. Orai ainda antes de dormir. Por volta da meia-noite, levantai, lavai as mãos com água e orai. Se vossa mulher estiver presente, ore ambos; se ainda não for batizada, retirai-vos para outro quarto, orai e voltai para a cama. Não hesitai, porém, de orar, pois aquele que se encontra casado não está manchado. Em verdade, os que já tomaram banho não precisam tomar outro pois encontram-se limpos. Fazei o sinal da cruz com o sopro úmido, recolhendo a saliva com a mão, e o vosso corpo será purificado até os pés, pois o dom do Espírito e a água do banho, oferecidos por um coração puro como se saíssem de uma fonte, purificam todo aquele que crê. Assim, é necessário orar nesse momento. Os antigos, que nos deixaram a Tradição, ensinaram-nos que nessa hora toda criatura descansa um momento para louvar o Senhor. Até mesmo as estrelas, as árvores e as águas param por um instante e, com toda a milícia dos anjos que servem a Deus, e junto com as almas dos justos, glorificam a Deus. Por esse motivo, todos os que creem devem se apressar para orar nessa hora. Para dar testemunho disso, assim diz o Senhor: "Eis que por volta da meia noite ouviu-se o clamor dos que diziam: 'Aí vem o Noivo. Saiam ao seu encontro'. E concluiu, dizendo: 'Vigiai, pois não sabeis a hora em que Ele virá'". Quando o galo cantar, levantai e orai, pois nessa hora, ao cantar do galo, os filhos de Israel negaram a Cristo, que conhecemos pela fé, confiantes na esperança da eterna luz da ressurreição dos mortos; temos os olhos fixos nesse dia. Fiéis: procedendo dessa forma, respeitando a Tradição, instruindo-vos mutuamente e exortando os catecúmenos, não sereis tentados nem perecereis, pois o Cristo estará sempre presente na lembrança.

XV. O Sinal da Cruz
Durante a tentação, fazei piedosamente na fronte, o Sinal da Cruz, pois este é o sinal da Paixão, reconhecidamente provado contra o demônio, desde que feito com fé e não para vos exibir diante dos homens, servindo eficazmente como um escudo. O Adversário, vendo quão grande é a força que sai do Coração do homem que serve o Verbo (pois mostra o sinal interior do Verbo projetado no exterior), fugirá imediatamente, repelido pelo Espírito que está no homem. Era isso que o profeta Moisés representava através do cordeiro morto na Páscoa e ensinava ao aspergir o sangue nos batentes das portas: simbolizava a fé que agora se encontra em nós, ou seja, a fé no Cordeiro perfeito. Ora, persignando-nos na fronte e nos olhos com a mão, afastamos tudo aquilo que tenta nos destruir.

PARTE 4: FINAL
Se estes ensinamentos forem recebidos com gratidão e Fé ortodoxa, permitirão a edificação da Igreja e a Vida eterna àqueles que crerem. Aconselho que [estes ensinamentos] sejam guardados por todos que tiverem o coração puro. Se todos ouvirem e seguirem a Tradição dos Apóstolos, nenhum herege (nenhum mesmo!) poderá vos afastar do reto Caminho. Na verdade, muitas heresias se desenvolveram porque os chefes não quiseram aprender a Doutrina dos Apóstolos mas, seguindo a própria fantasia, fizeram o que quiseram, isto é, o que não deveriam fazer. Amados, se omitimos algo, Deus revelará [a Verdade] aos que forem dignos, dirigindo a Igreja para que atraque no porto da Paz.

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